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Blog sobre a biblioteconomia, bibliotecário, biblioteca, informação, mensagem, usuário, TICs. O nome do blog foi "surrupiado" de um roteiro (para teatro ou cinema) escrito por Paulo de Castro, o maior bibliotecário da terra. E viva Kalímeros!

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Livro, leitura, meio digital

Abri o livro impresso "Diários de bicicleta", de David Byrne, e li dez páginas. Acessei no tablet o arquivo do livro digital (extensão epub) "Diários de bicicleta", de David Byrne, e li as mesmas dez páginas. Sentei em frente ao computador, abri o arquivo do livro digital (extensão pdf) "Diários de bicicleta", de David Byrne, e li novamente as mesmas dez páginas. O conteúdo era o mesmo, ainda que um ou outro detalhe tenha me escapado em cada uma das leituras. Eu poderia ainda abrir o arquivo do audiolivro (extensão mp3) "Diários de bicicleta", de David Byrne, e ouvir as mesmas "dez páginas". Mas não o fiz. Seria um tipo diferente de leitura, mas ainda assim seria uma leitura.

O que é mais importante: o livro ou a leitura? O suporte ou seu conteúdo? O objeto - que pode ser enfeite, ferramenta e até arma - ou a mensagem nele contida? E aqui cabe outra pergunta: qual o objeto de trabalho do bibliotecário? O livro ou a mensagem? A informação dirão todos. A mensagem, eu digo. Pois há diferença entre informação e mensagem. Vou recorrer a Capurro: mensagem é oferta de sentido e informação é seleção de sentido. Então informação está do outro lado, no domínio do usuário. Mas esse não é o tema aqui. O tema principal é o livro e a leitura. Afinal, livros existem para serem lidos!

O livro é um objeto fascinante. Por isso sua circulação é controlada em regimes totalitários. Mas na verdade o objeto é censurado por causa da mensagem que ele carrega. Nos milênios que nos separam das invenção da escrita, o livro foi utilizado como ferramenta de poder e controle. Porque por muito tempo a escrita e a leitura fizeram parte do mundo dos que estavam no poder. Mas o livro é tão perigoso assim para os poderes constituidos? Como já dissemos o livro não é perigoso, mas a mensagem que ele carrega sim; e a leitura que se faz dele também. Estamos vendo o poder da leitura nas recentes tentativas de controle que a internet, especialmente as redes sociais, vem sofrendo, mesmo em países democráticos. A informação nasce da leitura e a sociedade informada ganha mais poder para questionar seus governos e isso, mesmo nas sociedades democráticas ocidentais, não é bem visto pelos que detêm o poder.

Ah, mas não é esse o meu tema também. Eu quero mesmo  falar é da morte do livro, a morte que não aconteceu. Foi alardeada com o surgimento do eletrônico. O papel estava fadado a acabar. E com ele seus produtos derivados. Acredito que desde os primórdios da da evolução humana os avanços tecnológicos são vistos com desconfiança. Assim foi com a tecnologia dos livros. Do papel para o digital, o que mudou? A experiência sensorial da leitura, com certeza, mas o que mais?

O livro não morreu, porque não há razão para sua morte. E se morrer, que mal tem, se o que importa de fato é a leitura.


Os e-books. Há uma tendência em tentar comparar o livro impresso com o e-book, buscando caracterizá-los como objetos antagônicos. É comum ler por aí que o e-book decretou a morte do livro em papel. Também é comum ouvir que o livro impresso é eterno, que o e-book jamais ocupará seu lugar, por causa das “dificuldades” da leitura em tela. Há ainda quem acredite que os dois formatos coexistirão, justificando isso com uma comparação mais antiga. Segundo contam, quando a televisão surgiu muitos disseram que a morte do rádio estava decretada. Até concordo que no horizonte que nossa visão alcança e-books e impressos coexistirão. Mas não podemos tomar como parâmetro o exemplo da televisão e do rádio.

Esses veículos, embora sejam meios de comunicação, têm características diferentes: a base do rádio é o áudio (a fala), a da TV é o vídeo (a imagem). A televisão não extinguiu o rádio, mas lhe tomou parte da programação. O rádio teve que passar por certas mudanças. Inegável é o fato que rádio  e TV são lidos de forma diferente, enquanto o livro digital e o impresso são o mesmo objeto em formatos diferentes: sua base é o texto escrito. 

Uma comparação mais pertinente para exemplificar a relação impresso/eletrônico é a dos formatos de música. Porque o conteúdo é o mesmo, mas os formatos mudaram. O vinil reinou absoluto até os anos 1980, quando os CDs o superaram. O reinado dos CDs durou pouco, pois o surgimento do arquivo de música em formatos para computadores, tirou-lhe a supremacia. Este, no entanto, é um caso de gosto: há artistas que ainda hoje lançam seus trabalhos em vinil, que segundo eles tem mais qualidade que os formatos que o seguiram. Entretanto, como formato menos popular, e como depende de um dispositivo específico para leitura, o vinil tem sua vida relacionada à produção de aparelhos que o lêem.

No caso dos livros, assim como foi com a música, a facilidade de uso de um formato teve mais influência em sua popularização que a qualidade técnica; o que no caso da música é mais evidente. Ouvir música em vinil é diferente de ouvir música em mp3. Alguns detalhes são percebidos no vinil e se perderam nos outros formatos. Mas a evolução técnica dos novos players e formatos pode resgatar essa qualidade. Nos livros não existe essa diferença de qualidade do conteúdo. A diferença está no suporte, mas o conteúdo é o mesmo nos dois formatos.

Atualmente, o maior empecilho para a popularização dos e-books (falando do Brasil) está no "iletramento digital", que é tão grande quanto o "iletramento normal". E, é claro, nos modelos de negócios dos e-books, que os tornam menos atraentes que os impressos.

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